2 de fevereiro de 2011

Olhar em perspectiva

Há um par de anos atrás, numa loja de tapetes enquanto acompanhava dois amigos que estavam na altura a decorar a sua casa, dei por mim a olhar para a etiqueta de um tapete - muito feito, por sinal - onde figurava o valor de 600€ e dizer "Olha, este é barato!". Certamente que um tapete por 600€, ainda por cima feio, é uma enormidade, mas naquele momento foi isso que me saiu, depois de ter circulado pela loja e de ter visto um sem-número de tapetes, uns lindos, outros nem tanto, acima dos 1200€. É claro que em perspectiva, o de 600€ me pareceu francamente barato.


É quase sempre assim. Depois de termos passado por algo mais duro, mais intenso, mais complicado, mais caro, quando nos aparece pela frente algo que, por comparação, é menos do que o anterior, ficamos com a sensação de que temos perante nós uma trégua, uma réstia de sol por entre as nuvens da tempestade.


A A. foi hoje a uma entrevista de emprego e está muito entusiasmada. As condições são boas. Um horário regular, uma boa localização, que permite deslocar-se comodamente em transportes públicos, uma remuneração aceitável, funções dinâmicas e estimulantes.

Já perdi a conta aos diferentes empregos que a A. já teve. Uma loja de roupa, restaurante e supermercado dos pais, uma pastelaria (fabulosa), um hipermercado, tudo antes de concluir o curso, e depois professora do secundário, do básico, das AEC's, explicadora, formadora*, gestora de uma empresa, operadora de call centre... Esqueci-me de alguma? A A. já teve de enfrentar a constatação do fim de um sonho profissional, já teve de se sujeitar a acumular 4 part-times (4, meu deus!) para conseguir um ordenado mais ou menos normal e sei lá que outros desafios.

Surge-lhe agora a oportunidade de entrar para uma empresa onde eu já trabalhei e que já conheço bem, para assumir funções que pouco se prendem com questões didácticas, funções que envolvem a estimulante, mas também frustrante vertente de trabalhar por objectivos e que assumem um pendor comercial. Olho para o espólio de profissões que ela já teve e penso: bom, genica não lhe há-de faltar, paleio muito menos. Ela dá conta do recado!

Seja como for, não consigo deixar de pensar nesta questão da perspectiva: depois de um percurso tão atribulado, é claro que este emprego é bom, como o tapete que é barato.


Estou preocupada e apreensiva contigo, claro que estou!
Porque quero que as coisas comecem finalmente a correr melhor para ti.
Só queria era que as coisas fossem mais fáceis e que conseguisses um lugar a fazer aquilo de que realmente gostas e em que és boa.



* É a isto que se sujeitam
pessoas como eu que quiseram procurar o seu futuro
no mundo do ensino.
No meu caso,
felizmente (acho) acabei por entrar num atalho
que se revelou ser
o melhor caminho
para a estrada principal.

5 comentários:

  1. concordo a 100%.

    desde a morte do meu pai que há muitas e muitas coisas que não me fazem perder um segundo a pensar nelas porque deixaram de ter qualquer importância!

    (obrigada pelo comentário na Ervilha! :D)

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  2. Mas é que é mesmo assim... A vida mostra-nos que há sempre algo pior e acabamos por ver o "menos mau" como algo "bom".

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  3. InêsN:
    Olá!
    De nada! Gostei muito da tua Ervilha!
    Quer tenhamos ou não consciência disso, essa mudança de ponto de vista acaba por ter um efeito positivo em nós, seja qual for o móbil que nos leva a isso...

    Beijinho

    S*:
    E seria muito bom que tivéssemos plena consciência disso...

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  4. Já tentei deixar aqui um comentário, mas pelos vistos não seguiu, pois não amiga?!

    Antes demais, não consegui evitar uma sonora gargalhada ao recordar o episódio dos tapetes! ;) Mas o que é certo é que encontrei, nessa mesma loja, os tapetes certos, lindos e por muito menos do que 600€!!!

    Quanto à A., e trabalhando nessa empresa em questão, compreendo perfeitamente a tua apreensão...é um emprego que tem tanto de estimulante quanto de stressante!!

    Mas é bom, tal como os tapetes eram baratos, tal como os meus part-times são bons. Empregos que eu entitulava de temporários mas que se prolongam já por 4 e 5 anos...mas tendo em conta o panorama nacional, são bons!

    Agarra o teu emprego amiga, "nem sabes" a sorte que tens! E boa sorte para a A.!

    Beijinhos, VJ

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  5. Minha querida, sabes que me apareceram as lágrimas enquanto lia o teu texto? Tu és muito querida e sei que te preocupas comigo, mas nunca pensei que a minha situação profissional merecesse uma reflexão assim no teu blog:)
    Bem, vamos por partes, então:
    1 - A minha vida tem sido uma combinação de várias circunstâncias, umas mais felizes do que outras, daí toda a minha vontade de ter dinheiro e emprego. Durante a faculdade ajudou-me a ganhar experiência profissional e algum pé de meia. Depois da faculdade as coisas não correram propriamente como eu estava a pensar e o que seria o 'sonho' da minha vida,desvaneceu-se em menos de nada...
    2 - Achei piada à comparação com os preços, porque realmente depois de termos visto muitos preços e depois de acontecerem muitas coisas na nossa vida acabamos por nos 'contentar' com algo que pareça ligeiramente melhor, mais estável ou mais atractivo, mesmo que seja completamente ao lado daquilo que sonhámos para nós.
    3 - Bem, genica, é coisa que não me falta. Muitas vezes ando exausta, mas ainda penso no que é que gostaria de fazer mais na minha vida. Só funciono assim, por objectivos.

    Ai...já ficou longuíssimo este meu texto!
    Beijos**

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